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Arnesto nos convidou

Atualizado: 9 de jun. de 2021

por Fabiane Vitiello


Nasci paulistana da gema, como se diz por aqui. E adoro que seja assim!

Cresci em bairros típicos de São Paulo: Brás, Belém e Tatuapé. Vez ou outra, espichava até a Mooca, onde tinha amigos.

Durante 42 anos meus passos acompanharam, de pertinho, a mudança ocorrida no bairro do Brás. Imigrantes vindos da Europa, sobretudo da Itália, habitaram as suas vilas escondidas entre um e outro casarão. Posteriormente, migrantes vindos de diversas regiões do Norte e Nordeste do Brasil por lá estiveram. Suas ruas foram tomadas por músicas e costumes tão característicos desses povos. E eu estava lá, percebendo a transformação pela qual o bairro passava e o quanto ela também impactava em mim.

Morei no Brás desde o nascimento até os 8 anos de idade. Meu corpo carrega marcas das brincadeiras ocorridas por lá: do som das janelas da casa de minha avó (que casa!) ao serem abertas, e sente a textura dos paralelepípedos da maior parte de suas ruas e o frescor do vento que se mesclava ao cheiro do leite fabricado em uma das maiores cooperativas de laticínios brasileiras. Cooperativa, inclusive, que era um dos locais preferidos de minhas brincadeiras.

Confesso que cada vez que escuto o “Samba do Arnesto” meu coração palpita e transborda boas memórias.

O Brás me abriu os olhos, desde muito cedo, para a convivência entre os vários territórios do mundo.

Junto a esse território tão especial se entrelaça um outro: Embaré, bairro da Baixada Paulista. Eu sou composta pela areia das praias que sobe com o pé de vento e grudam em todo o corpo, sou composta pela maré baixa que por tantas e tantas vezes acolheu meus desejos de crianças e choros de adolescente, sou composta pelas queijadinhas compradas na praia, de forma abundante, pelo meu avô Orlando, sou composta pelo mate com limão que escorria pela minha garganta em um sol escaldante de verão, ah, sinto o toque de minha mãos pequenas envoltas na mão segura de minha avó para atravessar a avenida Bartolomeu de Gusmão e voltar para casa. Na outra mão, eu segurava um tesouro: o meu balde em formato de peixinho laranja cheio de conchas que se misturavam à pazinhas e rastelos de metal e madeira.

O Embaré é o território de minha descoberta de mundo. Das experiências mais fortes e afetivas vividas por mim ao longo dos primeiros anos de vida. Ele é meu emaranhado de histórias com significados profundos, essa é a minha certeza.

Localizada a 150 km de São Paulo está a cidade de Serra Negra, considerada uma das principais cidades do Circuito das águas. Muito frequentada por turistas de todo Brasil que buscam dias de calmaria em contato com a natureza. Para mim, Serra Negra sempre esteve atrelada a pouca calmaria e muita diversão! Piscinas dos mais diferentes formatos, tamanhos e temperaturas. Eu e minha irmã nos arremessávamos em toda a programação prevista para o dia. Monitores e jogos espalhados por todo local. Comilança de doces e sorvetes fora de hora e a presença, em especial, de meu pai. Sempre ativo entre uma e outra brincadeira das crianças ou entre os adultos que também se arriscavam em um jogo de futebol ou uma partida de bilhar. Esse foi o território que me permitiu a descoberta de meu amor por meu pai.

Tantos outros territórios passaram por mim naquele início de vida e também deixaram seus vestígios: Praia Grande, Itú, Lindóia, Aparecida, Peruíbe, Itanhaém...

Coloquei os pés em um avião aos 22 anos e de lá para cá não parei. Passei a desbravar territórios mais longínquos e, muitas vezes, nunca sonhados.

Já acompanhei o sol por vários verões em muitos estados brasileiros e vi a lua chegar em diversos países. Atravessei territórios, mudei as cores de minhas penas, parafraseando Rubem Alves em um dos textos que mais amo no mundo “A menina e o pássaro encantado”, e em todas viagens sonhei, assim como a menina, com a alegria do reencontro. Eles aconteceram, para minha alegria.

Territórios que me marcaram e permitiram que novas relações e experiências fossem vividas em inteireza. Territórios que me provocaram ações em relação às transformações necessárias na educação.

Hoje ao pensar em territórios, dois deles me atravessam profundamente. Vivo a presença constante de ambos em minha vida: São Francisco Xavier e Araxá.

Araxá é morada da família que me adotou. Por lá passo os dias entre gargalhadas, afeto e pães de queijo.

São Francisco Xavier é onde mora o meu coração e onde eu quero estar. Para sempre.

Desbravar territórios, desvelar espaços, caminhar por estradas inéditas e ruas desertas que acolhem os meus próprios pensamentos em ebulição, esse é um dos meus maiores prazeres na vida.

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1 comentário


Patricia Arruda Paty
Patricia Arruda Paty
09 de jun. de 2021

Fabi que interesa de escrita... Quanto encantamento e vivência nesta construção humana tão linda que você é .... És rica de risos, resiliência e força e Entre territórios fortalece o sonho que foi sonhado e desejado... Tudo muito lindo! Bjs

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